O imaginário das crianças sobre monstros
de colchão, de armário, de chão e o ilustre papão, calam as pequenas bocas,
aquietam os fachos altos, seguram os corpinhos vibrantes nas camas bem
preparadas. O medo aprisiona as mentes, que anulam os ânimos, que paralisam os
corpinhos, que depois de chorar, dormem. Feito anjos. Crueldade.
Uma linda mulher enche a cama.
Ela e os lençóis desfeitos, pele e fronhas cheirando a lavanda... Passeio as
mãos sobre seus pés, coxas, cabelos... Observo sinuosas curvas convidando a
encher a noite de mais e melhores sons. Mas eu sou um insone com enxaqueca. Não
posso oferecer a ela nada mais que minhas necessidades. Isto é animalesco. Não
é animador.
Na cozinha requento um café. Está
ruim. Abro a geladeira e negocio meu precioso sono contra minha ansiedade
enquanto oscilo a mão entre a cerveja e o suco de maracujá. Bebo a cerveja.
O sofá é confortável, a noite é,
nesta altura, de um silêncio absoluto. Estou bêbado e cansado da minha própria
companhia. Ligo o som e convido os Beatles para encher a sala. Depois de tocar
o mesmo disco 5 vezes, decido que isto merece mais volume. Depois de dançar e
cantar sem compromisso com a pronúncia, decido que isto merece uma melhor
performance. E mais volume.
A mulher acorda e reclama, eu ignoro.
As crianças choramingam incomodadas, eu ignoro. O vizinho acende as luzes em
protesto, eu ignoro. Neste momento eu sou um filho de uma égua bem mais feliz e
leve que eles. Tenho mais atenção agora do que tive em toda a semana e, tenho
menos de 40 minutos para chegar ao trabalho. Então só me resta desejar um bom dia, e deixá-los
em paz (?)